“Zero Real”, concluiu a Polícia Federal (PF) sobre os prejuízos alegados pelos clientes da Atlas Quantum após o desfecho de um inquérito aberto para apurar eventual crime de estelionato da falsa empresa, que oferecia promessas de rendimentos com arbitragem de bitcoin, mas ruiu em 2019 após um stop order da CVM.
O relatório da PF referente ao Inquérito Policial 2021.0023292-SR/PF/SP foi encaminhado pela instituição a cada parte por e-mail no último dia 28.
De acordo com a PF, o fato de ter constado R$ 0,00 de prejuízo na portaria inaugural do inquérito policial deu-se por conta de que nenhuma das pessoas que se identificou como vítima demonstrou ter sofrido qualquer prejuízo.
“Após as diligências determinadas quando da instauração do inquérito, evidenciou-se que não houve a prática de crime financeiro, tratando-se de fatos que podem vir a ser tipificados como crimes de estelionato e/ou contra a economia popular, de competência da Justiça Estadual”, diz um trecho da portaria compartilhada com o Portal do Bitcoin.
O órgão ressalta também o parecer expresso pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que é parte do inquérito. No documento, o regulador deixa claro que não houve negociação de valores mobiliários ou a oferta de contratos coletivos de investimento.
“Nesse contexto, em 02 de julho de 2021, o inquérito policial foi encaminhado para a Justiça Federal, com o número 5004258-92.2021.4.03.6181, com representação pelo declínio de competência, para a Justiça Estadual”, escreveu a PF.
“Por outro lado, importante mencionar que, conforme noticiado, já existe uma investigação em curso sobre o caso ATLAS QUANTUM, em andamento perante a 10ª Vara Criminal Federal de São Paulo, nos autos 5006513-57.2020.4.03.6181, sob a presidência de membro do Ministério Público Federal, em razão de decisão do Conselho Nacional do Ministério Público”, conclui o documento.
Do outro lado, um grupo de vítimas de pirâmide financeira da Atlas Quantum criou um movimento para denunciar publicamente a empresa de bitcoin e seu dono, Rodrigo Marques, mostrado nos atos através de um boneco de ar. Em abril deste ano, por exemplo, o grupo fez uma manifestação na frente de um prédio no Morumbi, um bairro de luxo da capital paulista, onde supostamente Marques estaria escondido.
Procurado para comentar a decisão da PF, o líder do movimento, Evandro Teruel, enviou a seguinte nota:
“Nossa comunidade reagiu com indignação, uma vez que o caso já foi investigado pela Polícia Civil e pacificado pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) como crime federal. Além disso, o delegado Daher deu mais valor ao parecer da CVM de que não houve crimes federais do que do próprio CNMP. Mas sabemos que isso não isenta Rodrigo Marques de crimes federais, já que a Investigação Federal corre no Ministério Público Federal. Além disso, há ainda pelo menos mais 3 inquéritos policiais contra Rodrigo Marques na Polícia Federal. Também causou indignação o parecer da CVM, favorável à Rodrigo Marques, depois de tudo que ocorreu no passado.
Nossos próximos passos serão recorrer da decisão do delegado da Polícia Federal de São Paulo, juntar os documentos apresentados neste Inquérito Policial ao inquérito federal em curso no Ministério Público Federal e concluir a denúncia ao FBI americano, por cidadãos americanos lesados pela Atlas. Lembrando que já conseguimos a denúncia à Interpol com ajuda das autoridades do México. Diante da clareza de que Rodrigo Marques não quer devolver o dinheiro de ninguém e nunca quis acordo, nossa comunidade continuará pressionando, monitorando os passos de Rodrigo Marques e aguardando o desfecho favorável que deve culminar na prisão de Rodrigo Marques e outros envolvidos no golpe. Há um consenso entre nós, não vamos parar. Nossa comunidade continua unida e cada vez mais forte com a entrada constante de mais vítimas ao nosso movimento”.
Acerca da decisão da PF, o advogado Rafael Salles, que representa o grupo de clientes da Atlas, enviou à reportagem o seguinte comentário.
“Só um percalço que não altera em nada o conjunto fático probatório e a adequação para fixação do caso na Justiça Federal. Tanto é que existe um procedimento investigatório tramitando atualmente sob a presidência de um Procurador da República, o qual detém poder de requisitar diligências, inclusive, à Polícia Federal. Nesse caso, o Departamento de Polícia Federal terá de cumprir, porquanto se tratar de ordem para a apuração dos fatos. Aqui não cabe ao delegado federal questionar, mas dar cumprimento às determinações.
De outro modo, existe a possibilidade de os próprios agentes investigadores do Ministério Público Federal investigarem.
O fato de o Departamento de Polícia Federal ter concluído a investigação e remetido os autos à Justiça Federal opinando pelo declínio de competência para a Justiça Estadual, em nada vincula o Poder Judiciário Federal que, aliás, pode entender ser o competente para julgar o caso.
O que existe de fato são duas investigações: a finalizada pela Polícia Federal que pode seguir na Justiça Federal e a investigação conduzida pelo Ministério Público Federal.
Cabe um destaque ainda a ser esclarecido sobre a atuação de delegados de polícia quando da elaboração do relatório final de uma investigação. A jurisprudência e a doutrina entendem que a autoridade policial não pode fazer juízo de valor quando do relatório final das investigações, devendo apenas descrever os fatos apurados e apresentar as provas colhidas durante a investigação”.
Procurada para comentar o assunto, a defesa da Atlas não retornou até o fechamento da matéria.